quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Desmond e Molly

O encontro de Molly e Desmond ocorreu de forma inusitada e única na história dos povos, mas que o cinema mostra com tanta freqüência como se fosse algo corriqueiro. Desmond saiu de seu quiosque no mercado municipal quando esbarrou em Molly que vinha distraída com seu pacote de laranjas. Ambos se viraram e, mal olharam um para o outro estavam apaixonados.
O que chamou a atenção de Molly foi o jeitão de cigano de Desmond. Com um lenço sobre a cabeça e um chapéu sobre o lenço, pulseiras de couro, anéis de prata e alguns fiapos de barba no queixo, Desmond logo se prendeu ao cabelo longo e liso de Molly, com seus olhos cor de mel e, principalmente, seu violão que carregava nas costas.
Naquele mesmo dia, ou melhor, algumas horas depois, os dois almoçavam juntos no restaurante do mercado. Ela pediu peixe, ele frango. E não foi só nisso que os dois discordaram. Ao contrário do cinema, foi difícil deles encontrarem algo que tivessem em comum, seja nas preferências, fosse no conhecimento ou na classe social de cada um.
Molly era rica. Filha de um pai importador de bebidas e uma mãe que bebia muito das bebidas que o marido importava e além disso era advogada. Tocava em uma banda de rock anos sessenta, em bares da região. No demais do tempo gostava de escrever poesias e ler biografias de pessoas importantes. Sua preferida era do Ghandy.
Já Desmond era pobre. Acordava todos os dias às cinco e ia até a distribuidora de frutas carregar seu estoque para o dia e as oito horas da manhã já estava com o quiosque aberto. Não entendia muito de música. Seu pai gostava muito, samba de morro, mas não conseguiu passar o gene musical para o filho. A mãe Desmond perdeu cedo e dela herdou o gosto por aqueles trajes que usava.
Quase no fim do almoço, meia hora antes de Desmond ter de voltar para o trabalho acharam algo que unia os dois: o desejo enorme de ter filhos. Ainda eram bem jovens. Ele com vinte e cinco ela com vinte e dois. Foi uma descoberta que uniu os dois e que fez com que aquela paixão repentina de quando se encontraram pudesse um dia se tornar algo mais.
Naquela mesma noite Molly iria tocar em um bar. Era a noite dedicada aos Beatles que ocorria a cada dois meses e costumava atrair muita gente. Desmond hesitou diante do convite. Sua folga só era no domingo, portanto teria de acordar cedo no dia seguinte cedo. Mas a insistência foi tanta, não por parte de Molly mas dele mesmo, que acabou aceitando. Chegaria atrasado, no entanto. Não queria chegar cedo para adiar ao máximo o momento de conhecer os amigos dela e ter de tomar uma cerveja com eles. Desmond era tímido.
Ele chegou quando tocavam “Come Togheter”, a terceira música da noite. Sentou em um canto do bar , de onde dava para ver a banda e, depois de tomar uma Coca, foi ficar de pé junto do palco. Molly, que era também a vocalista da banda, percebeu quando ele chegou e deu um sorriso simpático que fez com que ela se perdesse um pouco. Nada que desse para Desmond perceber . Tocaram mais uma hora e o momento que Desmond aguardava com calafrios chegou. Foi conhecer o resto da banda e tomar a tal cerveja em uma mesa exclusiva para a banda.
Eles eram legais mas meio protetores demais para com Molly.
-Então, meu amigo, quais suas intenções para com Molly ?
Sem jeito, Desmond gaguejou algo que ninguém ouviu e deram risadas. Molly chamou a atenção de seu amigo que, segundo ela, estava sendo inconveniente. O resto da conversa foi uma coisa meio padrão de quando se esta conhecendo os outros e Desmond se saiu bem. Na hora de ir embora, o primeiro beijo dos dois. E não acabou por aí. Os pais de Molly viajavam e ela o convidou para ir com ela. Ele foi.

Um tempo depois e Molly estava grávida. Eles já namoravam a alguns meses. Molly, cheia da grana e um tanto irresponsável, estava radiante. Era a realização de um sonho. Desmond recebeu a notícia meio apreensivo. Sabia que não precisava muito se preocupar com dinheiro mas estava com medo pois não sabia se Molly deixaria que ele participasse daquilo. Ela riu.
- Você é o pai, vai participar da forma que todo pai participa.
Ele ficou lívido. Afinal era a realização de um sonho para ele também. Apesar de pouco tempo de namoro já haviam trocado os primeiros “eu te amo”. E parecia que eram de verdade mesmo. Passavam o tempo todo juntos, Molly ajudando nas vendas e ele sacrificando suas horas de sono para vela cantar e tocar. O que fazia muito bem por sinal.
Os pais de Molly ficaram furiosos, assustados, confusos, mas logo passou. Desmond era um cara decente, digno de confiança, e afinal, eles se amavam. Decidiram não se casar mas morarem juntos, na casa de Desmond. Era simples mas com a quantidade de dinheiro que os pais de Molly injetavam no casal, e que Desmond não tinha nenhum pudor em aceitar, as coisas estavam indo muito bem.
O bebê nasceu nove meses depois, como todos costumam fazer. Era uma menina e iria se chamar Jude. O avós corujas adoraram o nome, que poderia ser qualquer um. Estavam tão embriagados de felicidade, aceitavam tudo. Molly teve umas complicações no parto, nada muito sério mas que fez com que ela ficasse dois dias internada. Desmond tirou uns dias para ficar em casa, que acabaram viram um mês e meio, enquanto que o funcionário de confiança dele tomava conta da loja.
E que mês maravilhoso! O casal adorava aquela criança. A vida deles tinha ganho um novo significado, amadureceram e passaram a se amar ainda mais. Quando a pequena Jude tinha cinco anos eles ficaram em dúvida se a colocavam em uma aula de natação ou de violão, as duas seria demais para a criança. Ganhou o violão.
Tudo estava dando certo para o casal e iria continuar assim indefinidamente, afinal um casal que se conhece desta forma esta predestinado a ser feliz. Desmond continuou no seu quiosque no mercado municipal, por onde passeava com a pequena Jude enquanto Molly continuava a tocar com a banda.

Nenhum comentário: